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Um site para pensar sobre tudo e chegarmos sempre a um singular pensamento final: sabermos que nada sabemos.
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Tiago Pimentel
Críticas dos leitores para: tiago_pimentel@hotmail.com

quinta-feira, abril 27, 2006



«The Producers», de Susan Stroman

Classificação:

Uma divertida reprodução cinematográfica da peça homónima da Broadway, sem grandes ideias de cinema, mas com um agradável e assumido lado de estúdio que parece desmentir, com suave elegância, todo o seu aparato. A presença contagiante de Will Ferrell e o anti-glamour fascinante de Nathan Lane, acabam por fazer esquecer a interpretação over the top de Matthew Broderick e algum esquematismo formal que, em última instância, podia reduzir o conceito riquíssimo do musical a uma mera colectânea de telediscos mais ou menos pomposos. Talvez seja um conceito «démodé», mas prefiro o artifício primitivo e clássico de «The Producers», à colagem arbitrária de músicas e imagens de «Chicago» ou à montagem hipervitaminada do narcótico «Moulin Rouge».

Tiago Pimentel

domingo, abril 23, 2006



«Lilith», de Robert Rossen

Classificação:

If I died tonight, would it have been enough? Then I'll live forever.


Não podia deixar de escrever sobre este filme, até porque vi recentemente a edição de dvd do clássico esquecido de Robert Rossen. Em boa verdade, Rossen é um cineasta cuja importância histórica parece, teimosa e incompreensivelmente, passar ao lado da memória cinéfila geral, concretamente a norteamericana. Não é dificil de perceber (mais dificil é de aceitar) que assim seja, tanto mais que a sua filmografia, lembremo-nos, maioritariamente celebrada pelos anos 50 (o apogeu, mas também a transição, do cinema clássico), já pouco guardava da sua herança americana. Em bom rigor, não podemos ser tão simplistas, até porque dizer isto significa, obviamente, validar o inverso. Isto é: pouco tinha do americano clássico, mas nela se começavam a observar as paisagens de um cinema americano ainda por celebrar. Sobre os seus filmes pesava já a tragédia da imagem bergmaniana, o onirismo quase surreal da câmara de Buñuel e a nova realidade formal da Nouvelle Vague, influências que, em boa verdade, eram menos uma herança ou um legado, e muito mais um novo património que Rossen ajudara a construir. E é bom não esquecer que, tanto a Nouvelle Vague como o cinema americano pós-50’s construiram movimentos suficientemente independentes para desenharem os seus próprios destinos, bem como um vasto leque de interrelações cinematográficas que, no limite, possibilitaram que se construissem mutuamente. Pouca gente nos EUA deu a devida importância a filmes como «Lilith» («All The King’s Men» foi o único a conquistar plenamente a cinefilia americana, vencendo o Oscar máximo, deixando, ainda assim, Rossen sem ganhar nada) e o reconhecimento, acabaria por vir, inequivocamente, da cinefilia europeia, nomeadamente das edições dos Cahiers.

«Lilith» aparece-nos três anos antes de «Bonnie and Clyde», curiosamente protagonizado também por Warren Beatty, e iniciava um período de oito anos onde, de facto, o cinema americano deixou de funcionar por modelos de produção e, para o melhor e para o pior, passou a obedecer apenas à imaginação dos seus criadores. «Lilith» teve esse estranho poder premonitório, não só sobre as coordenadas que viriam a colocar o cinema num complicado paradoxo artístico (algures entre a verdade do autor e do negócio), mas também no fim trágico da vida de Jean Seberg. Revendo na memória algumas imagens de «Lilith» quase apetece dizer, de forma absolutamente trágica e desconcertante, que Jean Seberg terá deixado um pouco da sua morte naquele filme. «Lilith» foi também o último filme de Rossen que acabaria por falecer dois anos depois. Sendo um filme sobre a perdição do amor, é também uma viagem perturbante aos limites da nossa sanidade. A personagem de Warren Beatty acaba por se aperceber de uma das maiores crueldades do universo. A saber: Amar nos limites do amor, implica descobrirmos também os limites negros do nosso corpo. Por outras palavras, a relação amorosa que Vincent, um funcionário de um asilo de doentes mentais, estabelece com Lilith, uma das doentes, acaba por destruir todas as memórias românticas de um cinema americano clássico (quase podíamos ver este «Lilith» como o negativo do sublime «Esplendor na Relva», de Elia Kazan) e reconhecer, como raras vezes o cinema o fez, que o amor pode ser a mais trágica doença de todas. No limite, tudo no filme acaba contaminado por essa doença, inclusivamente a câmara de Rossen que se vai deixando controlar pela morte das imagens, obrigando-nos a ver a inquietação do seu olhar.

«Lilith» permanece como um dos mais espantosos e perturbantes clássicos esquecidos do cinema americano. Um monumento de cinema e de reflexão, a ver e rever, sem medo de deixarmos nele, um pouco da inabalável segurança que acreditamos ter sobre o nosso corpo e os nossos destinos.

Tiago Pimentel

quarta-feira, abril 19, 2006

A morte da memória

Porque é que a televisão, ao mostrar imagens da morte de alguém vezes sem conta e de todos os familiares, amigos e fãs a chorarem, pensa sempre que estará a prestar homenagem à memória de quem morreu? Existe uma palavra que, para mim, tem sempre um peso inquestionável quando se coloca a questão da morte. A saber: o luto. Entenda-se, não se trata das questões tradicionais mais ou menos esquemáticas de configuração da roupa preta, orações obrigatórias, etc. Nada contra essas (e todas as) formas de sofrer, mas falo do luto enquanto expressão máxima e pessoal do sofrimento. E o sofrimento é, provavelmente, o mais íntimo sentimento do mundo, até porque, na maioria das vezes, é o mais reprimido. E assistir às inúmeras sessões de exploração gráfica e emocional que a TVI fez da morte do actor Francisco Adam, da série Morangos com Açúcar, ficou-me a sensação de um desrespeito tremendo, não só pela memória dele, mas também pela intimidade de quem desejava chorá-lo. Mais: captar essa intimidade e torná-la pública, como se fosse uma moeda de troca ou um património afectivo da empresa e, por consequência, de todo o país. Senti-me parte de um sofrimento do qual, em concreto, não faço parte. Não estou (nem nunca poderia estar) a questionar o valor da notícia até porque, devo dizer que colocar um rosto nas quatro mortes que houve nesta Páscoa, tem um peso mais trágico do que o mero anonimato das estatísticas. A TVI podia e devia fazer uma homenagem ao desaparecimento de um actor da sua casa, mas em vez disso optou por expor a sua morte como mais um acontecimento público do seu serviço noticioso. Deixou-me um bocadinho triste e desconcertado, confesso. Mas, infelizmente, não fiquei admirado...

Tiago Pimentel

domingo, abril 16, 2006



Though nothing can bring back the hour of splendor in the grass, glory in the flower, we will grieve not, rather find strength in what remains behind...

Passou ontem na RTP 2 um dos mais poderosos filmes de sempre: Splendor in the Grass, do recentemente falecido cineasta Elia Kazan. Uma oportunidade para rever toda a glória de uma das mais apaixonadas histórias de amor de sempre, recuperando a tragédia da prosa shakesperiana, mas devolvendo, ainda assim, às suas personagens o direito humano de contestarem os seus próprios destinos e ultrapassarem as tragédias que estes, para si, desenharam. 6 estrelas!

Tiago Pimentel

sábado, abril 15, 2006




«O Novo Mundo», de Terrence Malick

Classificação:

Um mundo sem pessoas

Uma primeira impressão negativa e até desconcertada - mas exterior ao filme: a forma incompreensível como a Lusomundo tem gerido a carreira deste objecto, adiando sucessivamente a sua estreia nas salas portuguesas. A data aponta agora para 4 de Maio, embora seja incerta a sua confirmação.

Sobre o filme, as primeiras impressões são de amarga desilusão, tanto mais quanto me lembro do anterior de Malick – sublime «A Barreira Invisível» - onde a composição das personagens partia das equações dos seus próprios pensamentos. Onde, n’«A Barreira Invisível» existia confissão de consciências, em «O Novo Mundo» existem monólogos descritivos e fora de tom. A importação do modelo formal e narrativo de «A Barreira Invisível» acaba por ser quimicamente aplicado ao dispositivo dramático de «O Novo Mundo», onde as suas regras e especificidades não foram devidamente pensadas e elaboradas. Não desmentimos a sua viabilidade, mas sim a sua generalização abstracta numa espécie de modelo narrativo que, no limite, possa encaixar em qualquer história. É bom relembrar que o fundamental em «A Barreira Invisível» não era o formalismo da voz off, mas sim o que ela (nos) dizia. Em «O Novo Mundo», as palavras deixam de interessar (tornam-se até redundantes e demonstrativas, explicitando o que um par de olhos e uma mente sóbria poderiam descodificar sozinhos) para se tornarem adereços decorativos de um modelo que ostenta a sua frágil pomposidade como moeda de troca artística.

Entretanto, os seus personagens são abandonados num vácuo de redundância narrativa, estagnados nas suas próprias retóricas, perdidos num pós-modernismo anónimo e exterior às suas formas. De facto, a contemplação retórica do olhar de Malick parece-me tanto mais evidente quanto avançamos na narrativa: o que parecia uma história de amor tocante entre um capitão britânico e uma nativa do mundo novo, rapidamente se fragmenta e transforma os seus actores em eremitas de um deserto de ideias, disfarçados por monólogos em off adaptados de «A Barreira Invisível» e filmados quase sempre em tom deslocado, como se os actores não pertencessem às suas paisagens (o caso de Christian Bale é por demais evidente).

Em todo caso, sobretudo na primeira hora de filme, existem alguns belíssimos momentos de cinema que celebram a descoberta do amor entre duas personagens culturalmente tão distantes (estou a recordar-me, por exemplo, da cena em que a Pocahontas salva o Capitão John Smith de ser executado pela sua tribo). No entanto, a falta de ideias e engenho não serve devidamente as ambições épicas e artísticas de «O Novo Mundo», abandonando-o, progressivamente, na inconsequência da sua retórica e nas encenações pomposas da sua verdade.

Tiago Pimentel

terça-feira, abril 11, 2006



«Como Despachar um Encalhado», de Tom Dey

Classificação:

Filme vulgar e menor sobre uma ideia curiosa de fobia romântica, com Matthew McConaughey e Sarah Jessica Parker interpretando, respectivamente, um trintão dependente dos pais e com fobia a relacionamentos sérios, e uma trintona profissional em simular relações amorosas para incentivar trintões dependentes a sairem de casa dos pais. Uma ideia interessante que acaba por se perder num argumento desinspirado, pontuado de momentos embaraçosos e uma rotunda falta de arte e engenho para construir imagens e sequências.

Tiago Pimentel

sábado, abril 01, 2006



«Boa Noite, e Boa Sorte», de George Clooney

Classificação
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É, venha o que vier, um dos mais estimulantes exercícios de cinema deste ano e uma evolução narrativa/dramática/cinematográfica considerável de George Clooney depois do interessante, mas inconsequente, Confissões de uma Mente Perigosa. Clooney reconstitui o período maccartista, recuperando o preto e branco enquanto algo mais que uma redundância formal ou de identificação automática de uma época, antes projectando na fotografia uma identidade específica da linguagem televisiva. Em boa verdade, Boa Noite e Boa Sorte é, também, uma homenagem à verdade e aos que não têm medo de a pronunciar, relembrando que houve um tempo, num mundo a preto e branco, que a televisão era mais do que um expositor de telenovelas e programas de ficção menores.




«Capote», de Bennett Miller

Classificação:

Interessante evocação das memórias do escritor Truman Capote, concretamente do processo criativo que antecedeu a sua derradeira obra – A Sangue Frio – bem como da relação romanesca que Capote manteve, durante anos, com um assassino condenado à morte. Dessa relação e de todas as contradições morais que nela se instalaram, A Sangue Frio podia ser o subtítulo deste episódio biográfico específico da vida do escritor, utilizando para seu benefício artístico a confiança ilimitada do referido assassino (cuja morte, acabaria também por sentenciar a morte artística do autor norteamericano).

Tiago Pimentel

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