Oscars 2006 - Colisão de OscarsÉ, de facto, a primeira vez em muitos anos que uma noite de Oscars fica marcada, não só por uma divisão homogénea e milimétrica dos prémios, mas também por uma capacidade de surpresa absolutamente desconcertante. A Academia, para o melhor e pior, mostrou que nada do que sabemos e conhecemos (e nós, que acompanhamos o trajecto dos filmes podemos deduzir previsões mais ou menos apuradas) nos pode garantir uma verdade absoluta e um sentido de superioridade face à cerimónia, como se conhecêssemos antecipadamente a sua sinopse. Não vale a pena pensar sobre o que terá causado a mudança radical da tendência favorita de
«O Segredo de Brokeback Mountain» (que acabou por perder o Oscar máximo para
«Crash - Colisão»): a Academia fartou-se de haver um único favorito? Lobbie homofóbico? Será que interessa? Ou será que a maioria dos membros gostou mesmo mais do filme de Paul Haggis e resolveu premiar a sua temática socialmente relevante, concretamente no contexto sócio-político dos EUA. É nestas alturas que devemos relembrar o que verdadeiramente nos interessa na cerimónia. Não escondo que me custou muito ver
«O Resgate do Soldado Ryan» perder o Oscar para
«A Paixão de Shakespeare» em 1999. Ou ver Martin Scorsese perder duas vezes o Oscar nos últimos três anos. Nem sempre a Academia se cruza com os nossos desejos; em boa verdade, creio mesmo que até em prole da indústria enquanto instituição do cinema como arte e negócio, a Academia nem sempre acerta para seu próprio benefício. Não me parece que o mais correcto seja adequarmos o nosso discurso - pro ou contra – baseado exclusivamente nas nossas opiniões individuais e pessoais. Até porque isso levaria, inexoravelmente, a problemas de coerência discursiva e descontextualizações constantes das ideias que defendemos.
Dito isto (e pareceu-me verdadeiramente importante dizê-lo), é importante perceber que os Oscars são, também, um reflexo da indústria em relação ao mundo e ao tempo. E este ano ficou bem sublinhada a preocupação da Academia em nomear filmes que, nas suas temáticas específicas, demonstraram também preocupação em filmar o mundo e os seus paradigmas. O filme mais nomeado do ano acabou por perder o Oscar máximo, mas a divisão (bem como a acumulação) de Oscars foi quase milimétrica: três Oscars para
«O Segredo de Brokeback Mountain»,
«Crash – Colisão»,
«King Kong»,
«Memórias de uma Gueixa» e zero para
«Munique» e
«Boa Noite e Boa Sorte», os dois melhores filmes nomeados, respectivamente por ordem de preferência pessoal. Foi uma noite de algumas emoções muito fortes (além da óbvia reacção explosiva e inesperada de toda a equipa de
«Crash – Colisão» quando foi anunciado o Oscar de Melhor Filme, houve também o controlo tremido de Philip Seymour Hoffman e a inspiração histórica de um ícone como Robert Altman), bem como de ironias certeiras e revestidas por uma honestidade comovente (o melhor exemplo terá sido o discurso comunitário de Clooney que dedicou o Oscar à comunidade de actores a que ele tão orgulhosamente pertence).
Uma última palavra para Jon Stewart. Apesar de Billy Crystal ser sempre o eterno
mr. showbusiness e o mais talentoso anfitrião que a cerimónia poderá contratar, o pivô de
«Daily Show» conseguiu, ao longo da noite, dar a volta ao guião algo limitado que preparou e conquistou pela sua capacidade de improviso. Para sempre ficará o
gag da noite: a piada de Stewart em relação a Martin Scorsese não ter nenhum Oscar e os Three 6 Mafia terem um. O humor dos Oscars
também se constrói à volta das suas alegadas injustiças e contradições. Aqui fica a lista de premiados:
Lista de PremiadosTiago Pimentel