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Tiago Pimentel
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quinta-feira, novembro 29, 2007



Eastern Promises, de David Cronenberg

Finalmente! Digo isto com grande alívio por saber que, vários meses após Inland Empire, é possível encontrar no cinema mais um dos grandes filmes deste ano (que, infelizmente, não foram muitos). Depois de um mergulho profundo no autorismo clássico fordiano com History of Violence, Cronenberg mantém a sua genética cinematográfica no seu mais recente filme - Eastern Promises – reencontrando a biologia do corpo humano como a sua mais iminente e irreversível tragédia. Recentemente, tive a oportunidade de ver o vídeo de uma entrevista de Cronenberg (já não consigo situar onde nem com quem) em que o cineasta canadiano se referia ao prolongamento invulgar das suas sequências mais gore e violentas.

Explicava então que a maioria dos filmes corta a sequência antes de acontecer a violação do corpo (um corte de navalha, uma facada, etc), enquanto os seus filmes pretendem explorar um conjunto de reacções desconcertantes que nos assombram ao vermos os segundos seguintes – isto é: a morte do corpo. Mais do que a morte, a própria tentativa biológica do corpo combater a sua morte, o seu destino. Cronenberg torna-se assim uma espécie de encenador operático dos trágicos destinos do nosso corpo, resgatando a gore enquanto estilo vulgarmente associado a série b para um estado de sublimação e catarse da alma humana. Daí que, quando vemos Viggo Mortensen a combater nu e o seu sangue a fundir o corpo com o gélido cenário (e ambos na presença aterrorizante da morte), nada parece estranho nem gratuito. Tudo está contextualizado e pertence a uma realidade formal que o cineasta cuidadosamente preparou e concretizou. Mais do que isso, essa realidade de combater desnudado é quase imposta pelo próprio filme e estranho seria manter-se com a toalha colocada durante a sequência toda. É num certo sentido, a irreversibilidade cronenberguiana. A irreversibilidade da sua tragédia e da sua narrativa.

A história da máfia russa em terras inglesas ajuda a compor um imaginário que, para muitos, será desconcertante e para outros será demasiado próximo. Seja como for, as diferenças culturais serão convenientemente ultrapassadas (mais do que isso, serão assimiladas pelo próprio filme) à medida que se decompõe uma das mais comoventes histórias de amor que o cineasta alguma vez filmou. A dor de Eastern Promises é a mais biológica de todas: a dor de perder um filho. E Cronenberg filma Naomi Watts como um corpo amputado de uma vida que parece querer a todo o custo recuperar numa outra forma (uma bebé que sobreviveu à morte da mãe). E o detalhe afectivo e pictórico de Viggo Mortensen é inquietante!

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