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Tiago Pimentel
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quinta-feira, dezembro 11, 2003

Redescobrindo Nemo

Apeteceu-me escrever um pouco mais sobre uma das mais interessantes fábulas animadas que se cruzaram com o nosso olhar nos últimos anos. Até porque, na maioria das vezes, há uma tendência para se tratar as animações de uma forma displicente ou numa leviandade paterna que espelha o pior que o crescimento (ou talvez apenas a distância da infância) nos pode causar. Enfim, estou a falar de uma certa indiferença inerte que habita alguns olhares, nomeadamente quando captam imagens produzidas por um estúdio de animação. Como se a ausência da carne do actor vivo ou do negrume das ambiências manga pudessem reduzir uma animação como «Finding Nemo» a uma diversão infantil na qual nos podemos enquadrar mas de forma discreta, como passageiros ausentes que se julgam superiores às imagens simpáticas mas apenas cativantes para os olhos mais novos. Desde já recuso incluir-me neste grupo. Até porque «Finding Nemo» parece-me um dos objectos mais ricos da actualidade cinéfila e que mais pede para ser (re)descoberto. Há tantas subtilezas. A minha preferida talvez seja Dory, uma simulação divertida dos clássicos comic relief mas, ao mesmo tempo, uma dolorosa projecção humana do amor... perdido, sem memória e sempre à procura de um lugar onde possa pertencer. Nesse sentido, a sua deambulação errática pelo oceano é tudo menos arbitrária, isto é: tem um sentido. Acima de tudo, um sentido humano e cinematográfico. É ela a ponte entre o pai Marlin e o filho Nemo. E não poderia ser de outra maneira, afinal ela é a alternativa feminina à figura materna que, nem a propósito, morre no início. Mas há um lado humano que percorre todos os traços animados destas personagens, algo que nos relembra que o humano pode existir sob várias formas e não necessariamente revestido de carne e osso. Tem a ver com a abstracção que dispositivos como o amor, a carência ou a solidão impõem ao nosso olhar. É possível sentirmos algo pelas paisagens abstractas e desertas de «Once Upon a Time in the West» e também pela máquina HAL9000, de «2001, Odisseia no Espaço», bem mais humana que muitas personagens descartáveis que por aí andam a fingirem-se de humanas. «Finding Nemo» é um desafio decisivo ao grau de compromisso emocional que estamos dispostos a assumir perante corpos desenhados sem carne nem osso, mas que sentem, reagem e comportam-se como se fossem hologramas dos nossos corpos. É na nossa atitude frente a esse desafio que se define a maturidade de cada um.

Tiago Pimentel

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