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Tiago Pimentel
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sexta-feira, outubro 14, 2005



Last Days

Class.:


Uma das maiores desilusões do ano. Um filme que recupera um «olhar» semelhante (a mesma «câmara», se quisermos) do anterior de Gus Van Sant – o sublime «Elephant» - com uma importante diferença. A saber: se a «câmara» de «Elephant» (aparentemente distante e científica) era como um corpo (mais um) invisível que expunha, por completo, a intimidade de uma certa juventude (a tal que vivia num imaginário que invocava o desastre de Columbine), já a «câmara» de «Last Days» não parece pertencer a sítio algum, nem a personalidade nenhuma. Cobain (em boa verdade, é apenas uma inspiração) reduz-se a um ser anónimo, a uma ideia de personagem que nunca chega a existir. Esse anonimato existia, de certa forma, em «Elephant»; mas nunca foi identitário; isto é: os personagens do liceu cruzavam-se como fantasmas que já percorrem os corredores de um cemitério, sem saberem que morreram, mas é impossível distanciarmo-nos das suas motivações e pensamentos, de sermos os seus cúmplices (de certa forma, de morrermos também com eles, no final).

Em «Last Days», o anonimato é totalitário e nem a «mise-en-scène» de Gus Van Sant disfarça o deserto de ideias que absorve este filme. Um filme é mais do que uma colecção de planos, e os equívocos aqui começam logo pela gestão de personagens: um desequilíbrio incompreensível traduzido pela oscilação da câmara entre Blake e os diversos secundários (todos iguais, em motivações, uns aos outros, com a variação de um casal gay - na verdade, eram 2 casais heterossexuais no início que acabam por se contaminarem mutuamente - que vive com Blake, cuja única razão de presença é... exibir a sua homossexualidade). No limite, é um filme amputado de qualquer ideia narrativa, convertendo-se numa penosa elipse em volta de... nada. Não há nada que faça mover a imagem, nada que justifique a imagem seguinte, nem mesmo a ideia garantida (por conhecermos a figura de Cobain) de que esta é uma caminhada para a morte.

De Cobain, Michael Pitt guarda apenas o corte de cabelo, uma vez que a sua «composição» é de um anonimato invulgarmente autista, encaixando na perfeição no estereótipo do músico drogado, incompreendido, sofredor e explorado pelos amigos. Fazer durar os quase 100 minutos de «Last Days» à volta de um deserto de ideias, sustentado por meia dúzia de planos exibicionistas, mas que não querem verdadeiramente dizer ou mostrar nada, revela um pretensiosismo que torna este filme ainda mais insuportável. Os mesmos olhares que aclamaram o neo-realismo de «Alice», ficarão fascinados com este embuste de Van Sant. Parece que chegámos a uma altura em que a emoção e o sinal humano foram confundidos pela frieza cliníca e documental, pela falsa contenção (a contenção que esconde apenas o deserto humano). Estaremos a caminhar para um cinema que procura a contenção radical, escondendo a emoção e o sentimento? No limite, teremos que definir, novamente, o que nos leva ao cinema. Isto é: o que nos faz sentir? Porquê? Por que é que a «câmara» de «Last Days» tem tanto medo das suas personagens? Por que razão tem tanto receio de as mostrar?

Tiago Pimentel

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