
Spielberg mantém «Munich» no «anonimato»
Não há memória, de facto, de um filme que, meses antes da sua estreia, sem qualquer promoção já suscitava as mais variadas reacções e expectativas: das mais entusiásticas (que acreditam que o cineasta de «A Lista de Schindler» poderá arrecadar o seu terceiro Oscar de Realizador) às mais frias (que suspeitam que o cineasta judeu não será capaz do distanciamento necessário à reconstituição trágica dos acontecimentos de 1972). Em boa verdade, nada disto invalida o seguinte: «Munich» é um fenómeno inédito nas grandes produções oscarizáveis de Hollywood. O filme viaja na penumbra dos grandes merchandisings e das megalómanas campanhas de marketing, por duas razões muito simples: primeiro, porque até ao momento ainda só lhe conhecemos (e apenas os ficámos a conhecer há menos de um mês) o trailer e o poster oficiais; e, segundo, porque já correm rumores nos bastidores de Hollywood que Spielberg tenciona manter o filme nos espaços vazios da divulgação. Concretizando, não haverá lugar para os habituais junkets de imprensa para promover o filme, nem tão pouco será iniciada uma campanha promocional direccionada para os membros da Academia que votarão nos Oscars. De facto, é incontornável que só alguém com o poder industrial e artístico de Spielberg poderá ir em frente com uma estratégia destas. Será, também, curioso ver que tipo de word of mouth o filme irá produzir, sobretudo depois de sabermos que Kathleen Kennedy (conhecida por ser bastante contida nas suas reacções) já viu o filme e reagiu estupefacta, dizendo mesmo que pode ser o grande filme da carreira de Spielberg.
Tudo isto deverá impor, aos mais desatentos claro, uma releitura das capacidades profissionais de Spielberg, tantas vezes olhado como imperialista americano e sinónimo automático de um cinema direccionado apenas para os grandes números de bilheteiras. Será interessante ler, agora, as críticas desses detractores de Spielberg que sempre optaram pelo simplismo de julgar o cineasta à luz de dois ou três lugares-comuns que em nada expressam a sua totalidade humana, formal, narrativa e artística. É pena que tenha de aparecer um caso tão explícito quanto este para alguns sacerdotes bem pensantes da nossa praça terem a oportunidade de deixar de praticar suicídio intelectual, cada vez que um filme de Spielberg estreia nas salas de cinema.
Tiago Pimentel