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Um site para pensar sobre tudo e chegarmos sempre a um singular pensamento final: sabermos que nada sabemos.
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Tiago Pimentel
Críticas dos leitores para: tiago_pimentel@hotmail.com

terça-feira, novembro 29, 2005



Spielberg mantém «Munich» no «anonimato»

Não há memória, de facto, de um filme que, meses antes da sua estreia, sem qualquer promoção já suscitava as mais variadas reacções e expectativas: das mais entusiásticas (que acreditam que o cineasta de «A Lista de Schindler» poderá arrecadar o seu terceiro Oscar de Realizador) às mais frias (que suspeitam que o cineasta judeu não será capaz do distanciamento necessário à reconstituição trágica dos acontecimentos de 1972). Em boa verdade, nada disto invalida o seguinte: «Munich» é um fenómeno inédito nas grandes produções oscarizáveis de Hollywood. O filme viaja na penumbra dos grandes merchandisings e das megalómanas campanhas de marketing, por duas razões muito simples: primeiro, porque até ao momento ainda só lhe conhecemos (e apenas os ficámos a conhecer há menos de um mês) o trailer e o poster oficiais; e, segundo, porque já correm rumores nos bastidores de Hollywood que Spielberg tenciona manter o filme nos espaços vazios da divulgação. Concretizando, não haverá lugar para os habituais junkets de imprensa para promover o filme, nem tão pouco será iniciada uma campanha promocional direccionada para os membros da Academia que votarão nos Oscars. De facto, é incontornável que só alguém com o poder industrial e artístico de Spielberg poderá ir em frente com uma estratégia destas. Será, também, curioso ver que tipo de word of mouth o filme irá produzir, sobretudo depois de sabermos que Kathleen Kennedy (conhecida por ser bastante contida nas suas reacções) já viu o filme e reagiu estupefacta, dizendo mesmo que pode ser o grande filme da carreira de Spielberg.

Tudo isto deverá impor, aos mais desatentos claro, uma releitura das capacidades profissionais de Spielberg, tantas vezes olhado como imperialista americano e sinónimo automático de um cinema direccionado apenas para os grandes números de bilheteiras. Será interessante ler, agora, as críticas desses detractores de Spielberg que sempre optaram pelo simplismo de julgar o cineasta à luz de dois ou três lugares-comuns que em nada expressam a sua totalidade humana, formal, narrativa e artística. É pena que tenha de aparecer um caso tão explícito quanto este para alguns sacerdotes bem pensantes da nossa praça terem a oportunidade de deixar de praticar suicídio intelectual, cada vez que um filme de Spielberg estreia nas salas de cinema.

Tiago Pimentel

segunda-feira, novembro 28, 2005




Harry Potter e o Cálice de Fogo

Classificação:

Um caso paradigmático de um universo que se esgotou no primeiro filme e que tem vindo, a partir daí, a reciclar a fórmula sem um sentido de auto-paródia que resgate esta saga de uma seriedade dramática que, em boa verdade, nunca vai além da encenação prosaica e do videojogo de plataformas. Chegámos a um modelo esquemático que acaba por demonstrar as suas próprias insuficiências, seja na ilustração gráfica e inconsequente dos acontecimentos (como um jogo de quidditch ou um labirinto, filmados sem ideias de «mise-en-scéne» e uma montagem serviçal), como no encadeamento primitivo dos acontecimentos, como se vivessemos um videojogo, fazendo a história avançar saltando de nível para nível. Em boa verdade, assistir a «Harry Potter e o Cálice de Fogo», deixa a sensação de estarmos a assistir a alguém (outro espectador, por exemplo) a «jogar» o filme, deixando-nos a nós o direito irreversível de observarmos o seu jogo.

Se, por um lado, o imaginário de Harry Potter surge nos bastidores de outras tragédias de ficção e fantasia, nomeadamente das grandes sinfonias de sci-fi como Star Wars, por outro, representa uma variação menoríssima das suas coordenadas dramáticas, esgotando o modelo de fantasia na mera exposição dos seus efeitos especiais (desde a ilustração de um feitiço até sequências monótonas de perseguição de dragões). No limite, estaremos a assistir à deterioração do que entendemos como cinema fantástico: se, por um lado, o olhar actual precisa de uma vassoura a voar para reconhecer esse imaginário, por outro, estaremos a perder as subtilezas a que o «género» se permite (não será por demais relembrar que um fotograma de Videodrome, de Cronenberg, ou - mais recentemente - de Donnie Darko, de Richard Kelly, incorporam muito mais «fantástico» do que qualquer filme da saga Harry Potter, bem como redescobrem o cinema fantástico como mais uma forma de desafiar a nossa disponibilidade mental e afectiva).

Neste 4º filme, nada de novo a assinalar, muitos efeitos especiais, muitos desafios novos, muitos adereços secundários e o mesmo fatalismo de «fim de mundo» a espreitar em cada esquina narrativa, sem um corpo à altura de o representar (por momentos, Ralph Fiennes sacode o universo Potter com um vilão recriado a partir de uma galeria incontornável de monstros – Nosferatu, provavelmente).

Tiago Pimentel

domingo, novembro 13, 2005



Class.:

À Procura da América

Uma pequena maravilha! Um filme que viaja nos bastidores do melodrama e reconstrói a fábula americana como reflexo narrativo de todas as identidades. «Elizabethtown» relembra, antes do mais, uma verdade ancestral: a de todos transportarmos connosco, os lugares que visitamos e neles deixarmos, também, pequenos fragmentos do nosso corpo. Tanto mais que o protagonista (interpretado por Orlando Bloom) personifica uma certa errância que tem muito pouco de anónima; ela é, no limite, a herança paterna que nos cabe descobrir. Bloom interpreta um jovem (Drew Baylor) empresário de sapatos que acaba por atingir o mais rotundo falhanço da sua carreira profissional. Consumido pelo peso da vergonha e frustração, Drew considera pôr termo à sua vida... mas antes de o fazer, o seu pai falece, colocando-lhe indirectamente um novo desafio moral. A saber: redescobrir um novo sentido para existir.

Bloom, reconhecendo-lhe todas as (imensas) limitações que lhe aponto, reconheço também que, neste caso específico, não compromete o dispositivo dramático do filme. Aliás, creio mesmo que o seu carisma anorético e a sua expressão desfocada acabam por funcionar mesmo a favor da errância existencial do personagem, emprestando-lhe alguma gravidade que, noutra configuração dramática e narrativa, facilmente se desfazia no ridículo. Kirsten Dunst, resplandecente, habita uma personagem cuja errância se expressa simbolicamente na sua profissão (hospedeira), bem como se desmente na reconstrução de um caminho para Drew seguir e que, de certa forma, os integre aos dois. Creio, também, que Cameron Crowe está a herdar do cinema mudo, uma forma específica de integrar a música nas imagens; isto é: não se trata de preencher as imagens com música, mas sim de as definir como imagens musicais. No limite, não será a música que é intrusiva – uma vez que esta já se tornou a norma formal – mas, sim, os momentos sem música, acabando mesmo por produzirem um silêncio ensurdecedor (e o filme gere de forma exemplar esses «silêncios»).

Cameron Crowe filmou, com este «Elizabethtown», o seu filme mais pessoal, não só por estar directa e intimamente ligado à morte do seu pai, mas também por nele se sentir uma invulgar pulsão genuína no fluxo que dirige as imagens. Genuína porque genuinamente imprevisível: a imagem seguinte é sempre exterior a qualquer previsão de «realizadores de bancada» que lhe queiramos impor. E é, afinal de contas, um filme profundamente americano. Em boa verdade, toda a viagem final de Drew é a ilustração da canção de Simon & Garfunkel, America. Ele partiu em busca da América, a tal América profunda, do interior, onde se reencontrará consigo mesmo. «Elizabethtown», no fundo, é um filme construído como reflexo da vida, habitando os mesmos desconcertantes paradoxos e solidificando-se nos seus diversos desequilíbrios narrativos.

«Elizabethtown» é o nome de uma cidade pequena no interior da América. Mas acaba por ser isso e muito mais: é o lugar simbólico para mergulhar na infinita beleza da tristeza e, daí, caminharmos em frente. Aliás, a ideia sempre presente do caminho parece-me essencial para interiorizarmos o imaginário de «Elizabethtown»: o caminho é, no limite, a construção inacabada do percurso de vida. Esse caminho é-lhe desenhado por ela (Kirsten Dunst) no reconhecimento simbólico de um passado que ele ainda não herdou. Um passado que passa, inexoravelmente, pelo reconhecimento dos lugares que o ilustram; lugares que, por sua vez, são vividos e construídos pelas pessoas que os habitam. Dir-se-ia, no final, que todos habitamos Elizabethtown.

Tiago Pimentel

quinta-feira, novembro 10, 2005



«Aurora», de F.W. Murnau

Class.:

Renascimento

Louis Lumiere disse, enquanto as pessoas se perdiam no deslumbramento de um comboio projectado pelo histórico cinematógrafo: o cinema é uma invenção sem futuro. Olhamos para «Aurora» e forçamo-nos a uma correcção que Lumiere não terá previsto: o cinema pode ser uma invenção sem passado, sem presente e sem futuro. Sem nenhum ou com todos, o valor final transcende a mera soma dos factores e redescobrimos «Aurora» como um objecto sem lugar no tempo: foi feito há quase 80 anos mas continua a ser actual. Que ilusão o faz aproximar dessa errância específica de não ser dono de tempo nenhum? É falado, sem o ser. Tem todas as cores do universo, sem as ter. A ilusão estará também em Janet Gaynor, algures entre a elegância rústica do seu penteado tímido e os caracóis soltos pelo mar. Actriz que - é bom relembrar - pontuou a história dos Oscars com uma curiosidade inédita: a de ter sido a única actriz a ganhar um Oscar por vários papéis no mesmo ano («Aurora», «Seventh Heaven» e «Street Angel»). Foi também uma das poucas, de uma geração específica de actores, que conseguiu transitar do período mudo para o cinema ‘falado’ – dizia-se, na altura, que a sua voz encantadora soava bem (e, em meados dos anos 30, era mesmo a actriz do momento em Hollywood) mas alguns perceberam que Janet transportava consigo a herança do actor mudo: aquele que representa sem precisar de falar.

E é essa a ilusão de que se falava. A maior de todas: a ilusão de tudo ouvirmos, sem, no entanto, nada ser falado. No limite, a ilusão de que uma imagem, em cinema, arrasta em si mais verdade do que o real que olhamos à nossa volta (precisamente o oposto do que Lumiere previra, pensando que as pessoas se cansariam de olhar para imagens que poderiam ver no seu dia-a-dia). Em «Aurora» vive-se a apoteose dessa ilusão do mudo (e porque não do cinema?). A sensação de deslumbramento perante cada imagem, como se as descobríssemos, pela primeiríssima vez, no seu indefinivel encanto. Sem querer beliscar nenhuma sensibilidade em particular (a começar pela minha), importa referir que, na vanguarda da indústria digital, nem todos os efeitos especiais juntos conseguem reproduzir o estarrecimento de um plano pelicular de «Aurora». Daí que, no final, o nascimento do sol pareça queimar a própria fita; é da película que surge o assombramento, da possibilidade de fotografarmos o mundo como paisagens queimadas por um olho obsessivo que ilumina os rostos e os corpos como deuses do seu próprio mundo.

É, antes do mais, um melodrama modelar para outros grandes clássicos que se lhe seguiram (desde Minnelli, a Cukor) e habita, justamente, nas mesmas fraquezas que nos tornam assustadores e encantatórios, nos limites da nossa identidade. «Aurora» revisita um casal (George O’Brien / Janet Gaynor) contaminado pela presença de uma terceira parte: a «mulher da cidade» (Margaret Livingston). Levado ao extremo dos seus limites, os dois protagonistas, ligados umbilicalmente por uma força que consome a repulsa, redescobrem-se no amor que julgavam perdido. Em boa verdade, há um sentido trágico que acompanha todo este melodrama e que desembocará, seja de que maneira for, nas águas daquele mar. É nessas águas que se jogam os destinos dos personagens: assustados pela morte, mas despertos pela possibilidade do renascimento. Uma obra prima absoluta e intemporal, a (re)descobrir no cinema Nimas, em cópia restaurada.

Tiago Pimentel

terça-feira, novembro 08, 2005

Trailer de Munich em alta definição

No seguimento da notícia de ontem sobre o lançamento do site oficial e respectivo trailer de Munich, importa complementar agora com o lançamento, no site da quicktime, do mesmo trailer mas na sua versão de alta definição. Assim, quem puder despender de mais uns megabytes, poderá ir aqui visionar o trailer em todo o seu esplendor.

Tiago Pimentel

segunda-feira, novembro 07, 2005

Trailer de Munich

O novo filme de Spielberg já tem trailer e site oficial. De resto, o site oficial (com respectivo trailer e sinopse) pode ser encontrado aqui. Para já, e em jeito de primeiras impressões, importa reter o impacto emocional que a simples fragmentação de imagens documentais (provavelmente reproduzidas) e imagens de ficção, sem uma estrutura sinóptica tradicional dos trailers de promoção, acaba por produzir em nós. É um trailer que parte de um conceito simples: é a história do que vem a seguir! A seguir a quê? Às imagens documentais que surgem no início e que são alimentadas, a seguir, pela fragmentação de imagens de ficção sem tentar formar uma sinopse. Nelas (nas imagens) apenas revemos emoções, ideias e dilemas que, seguramente, serão devidamente (des)construídas e estruturadas nos corpos que as transportam. Eric Bana parece-me viajar com toda a solidão do universo.

Os «watchers» especialistas americanos já constatam, há algumas semanas, que este será o grande candidato aos Oscars deste ano. A saúde actual do mundo permite algumas resistências da parte de quem receia que Spielberg normalize as diferenças e as reivindicações que definem o conflito entre israelitas e palestinianos, mas o cineasta já confessou que são os pormenores humanos que lhe interessam. E não podia ser de outra maneira. O filme tem data de estreia marcada para 23 de Dezembro e está em contra-relógio para ser mostrado à imprensa a tempo dos Globos de Ouro (dead line termina a 8 de Dezembro). Entre nós, a estreia é ainda uma incógnita, mas eu apostaria para Fevereiro, algures entre as nomeações e a cerimónia dos Oscars propriamente dita.

Tiago Pimentel

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