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Um site para pensar sobre tudo e chegarmos sempre a um singular pensamento final: sabermos que nada sabemos.
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Tiago Pimentel
Críticas dos leitores para: tiago_pimentel@hotmail.com

sábado, janeiro 31, 2004




Most men, they'll tell you a story straight true. It won't be complicated, but it won't be interesting either.

«Big Fish», Tim Burton

Site Oficial

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O novo Feiticeiro de Oz?

É justo pensar neste título, mesmo sabendo o incomensurável peso que o «Feiticeiro de Oz» tem sobre a estrutura formal da fábula popular. «Big Fish» tem uma grande desvantagem em relação ao filme de Fleming: tem Ewan McGregor em vez de Judy Garland. E a opção de casting até pode ser compreensível. Tim Burton procurava um actor capaz de dar «glamour» e um ar «gostem de mim» à sua personagem principal, embora McGregor esgote a criatividade artística de Tim Burton e das suas personagens sobrenaturais na sua insuficiência dramática. Chega a ser desconcertante olhar para algumas das mais ricas criações humanas deste filme (estou a lembrar-me do gigante e de Helena Bonham Carter) completamente congeladas pela inércia emocional e pela presença superficial de Ewan McGregor. O actor confundiu errância com turismo e acaba por se passear pelo filme como um turista da sua própria história.

Mas o filme joga em dois campos: a história do jovem Ed Bloom (McGregor) e o conflito entre o velho Ed Bloom (Albert Finney) e o seu filho Will (Billy Crudup). Se a primeira história se perde, por vezes, em excessos e redundâncias românticas (originadas, sobretudo, pela falta de verdade de McGregor), já a segunda se transcende e sublima. A relação entre pai e filho e a procura da verdade foi das coisas mais belas que Burton alguma vez filmou. Aliás, faz sentido neste filme percebermos que a procura da verdade é radicalmente diferente da procura dos factos. E que perceber quem somos não passa sempre por compreendermos os factos que nos definem. Passa, sobretudo, pela verdade em que nos vemos projectados (ou em que nos gostaríamos de ver). E essa verdade passa pela fotografia barroca de Philippe Rousselot, pela genuína honestidade de Albert Finney, pela imaginação interminável e ilimitada de Tim Burton e pelo conceito belíssimo desta história de bruxas e gigantes. É impossível ficar indiferente ao final do filme assim como a toda a descoberta deste mundo. Talvez a imaginação ainda seja o lugar mais verdadeiro, onde todos nós regressamos, ocasionalmente, para lidarmos com a banalidade da verdade a que as certezas científicas e lógicas nos condenaram. Talvez seja esse, afinal, o lugar ideal para (nos) procurarmos.

E se uma parte de «Big Fish» está mais próxima de «O Feiticeiro de Oz», a outra parte mais autobiográfica tem a ver com os ritmos e a fragmentação de «Forrest Gump». E torna-se inevitável pensar que o Tom Hanks dessa altura era perfeito para o papel protagonista deste filme de Tim Burton. Em todo o caso, é uma das mais belas fábulas dos últimos anos e um dos mais comoventes fenómenos sobre a descoberta da identidade. Saber, no limite, que essa identidade não está na história que conhecemos ou nos factos que julgamos perceber e que tranquilamente dominamos ao abrigo da verdade, mas antes nas ilusões, nos sonhos e nos desejos que, afinal de contas, nos definem enquanto Seres humanos e nos distinguem enquanto indivíduos.


Tiago Pimentel

terça-feira, janeiro 27, 2004

Dia de nomeações da Academia e de algumas surpresas também. Comecemos pelos óbvios: «O Senhor dos Anéis» lidera a tabela com 11 nomeações e prepara-se para ser o grande vencedor da noite. «Nascido Para Ganhar», com 7 nomeações, poderá ser o cabeçudo da noite e ficar a zeros. Para «Master and Commander» também a noite não deverá sorrir de forma brilhante até porque nas categorias em que se encontra nomeado, a concorrência é quase sempre muito forte. Para o filme de Eastwood, Tim Robbins deverá ser a aposta mais segura, enquanto que Penn dividirá com Murray as probabilidades mais elevadas no galardão de Melhor Actor. Este poderá também ser um ano importante para Portugal, uma vez que Eduardo Serra recebeu a nomeação pelo seu trabalho de fotografia em «Rapariga com Brinco de Pérola» e tem sido referido com bastante recorrência pela facção crítica mundial. Será o suficiente para o Oscar? Surpresas: toda a categoria de Melhor Actriz. Primeiro, pela omissão de Nicole Kidman e Evan Rachel Wood e, depois, pela inclusão daquela que se tornou a actriz mais jovem (13 anos) a ser nomeada para o Oscar de Melhor Actriz: Keisha Castle-Hughes. A Miramax fica sem representante este ano (uma chapada de luva branca?) uma vez que o seu «Cold Mountain» foi quase totalmente esquecido das nomeações. À imagem do ano passado, começa a desenhar-se um estranho paradoxo: sendo o Oscar de Melhor Filme o mais prestigiado e cobiçado galardão da noite, acaba por ser também o menos interessante. Isto porque o filme que, à partida, irá arrecadá-lo, apenas conseguirá provavelmente um Oscar dito importante (o de realizador). Os outros prémios que o filme de Peter Jackson irá reunir serão de categorias técnicas. O verdadeiro interesse incidirá sobre filmes como «Lost In Translation», ou em categorias como as de Actor, Actriz ou Argumento. Será interessante verificar os resultados finais do confronto Penn/Murray. Falta cerca de um mês. Os próximos prémios a servir de importante barómetro serão os Guild de realizadores e actores. Aguardemos. Aqui ficam as nomeações da Academia:


Melhor Filme:
«O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Mystic River»
«Nascido para Ganhar»
«Lost in Translation - O Amor É Um Lugar Estranho»


Melhor Realização:
Fernando Meirelles, «Cidade de Deus»
Sofia Coppola, «Lost in Translation - O Amor É Um Lugar Estranho»
Clint Eastwood, «Mystic River»
Peter Jackson, «O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»
Peter Weir, «Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»


Melhor Actor:
Johnny Depp, «Piratas das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra»
Ben Kingsley, «House of Sand and Fog»
Jude Law, «Cold Mountain»
Bill Murray, «Lost in Translation - O Amor É Um Lugar Estranho»
Sean Penn, «Mystic River»


Melhor Actriz:
Keisha Castle-Hughes, «A Domadora de Baleias»
Diane Keaton, «Something`s Gotta Give»
Samantha Morton, «Na América»
Charlize Theron, «Monster»;
Naomi Watts, «21 Gramas»


Melhor Actor Secundário:
Alec Baldwin, «The Cooler»
Benicio Del Toro, «21 Gramas»
Djimon Hounsou, «Na América»
Tim Robbins, «Mystic River»
Ken Watanabe, «O Último Samurai»


Melhor Actriz Secundária:
Shohreh Aghdashloo, «Uma Casa na Bruma»
Patricia Clarkson, «Pieces of April»
Marcia Gay Harden, «Mystic River»
Holly Hunter, «Treze»
Renée Zellweger, «Cold Mountain»


Melhor Filme Estrangeiro:
«As Invasões Bárbaras» (Canadá)
«Twilight Samurai» (Japão)
«Evil» (Suécia)
«Twin Sisters» (Holanda)
«Zelary» (República Checa)


Melhor Argumento original:
«À Procura de Nemo»
«As Invasões Bárbaras»
«Estranhos de Passagem»
«Na América»
«Lost in Translation - O Amor É Um Lugar Estranho»


Melhor Argumento Adaptado:
«American Splendor»
«Cidade de Deus»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«Mystic River»
«Nascido para Ganhar»


Melhor Filme de Animação:
«À Procura de Nemo»
«Brother Bear»
«Les Triplettes de Belleville»


Melhor Direcção Artística:
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Nascido Para Ganhar»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«O Último Samurai»
«Rapariga com Brinco de Pérola»


Melhor Fotografia
«Cidade de Deus»
«Cold Mountain»
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Nascido Para Ganhar»
«Rapariga com Brinco de Pérola»


Melhor Guarda-Roupa:
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Nascido Para Ganhar»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«O Último Samurai»
«Rapariga com Brinco de Pérola»


Melhor Montagem:
«Cidade de Deus»
«Cold Mountain
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«Nascido Para Ganhar»


Melhor Caracterização
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«Piratas das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra»


Melhor Banda Sonora:
«À Procura de Nemo»
«Cold Mountain»
«O Grande Peixe»
«Uma Casa Na Bruma»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»


Melhor Canção:
"Into the West" - «O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
"A Kiss at the End of the Rainbow" - «A Mighty Wind»
"Scarlet Tide" - «Cold Mountain
"Les Triplettes de Belleville" - «Les Triplettes de Belleville»
"You Will Be My Ain True Love" - ««Cold Mountain»


Melhor Som:
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Nascido Para Ganhar»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«O Último Samurai»
«Piratas das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra»


Melhor Montagem de Som:
«À Procura de Nemo»
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«Piratas das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra»


Melhores Efeitos Visuais:
«Master and Commander: O Lado Longínquo do Mundo»
«O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»
«Piratas das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra»

Tiago Pimentel

segunda-feira, janeiro 26, 2004

Em jeito de antecipação para os Oscars, convém reter os primeiros grandes resultados que servem de previsões mais ou menos seguras: os Globos de Ouro. De notar o domínio cada vez mais incontestável do Senhor dos Anéis, a presença de Charlize Theron e o «intruso» independente Lost In Translation.


Filme (Drama): «O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»

Realização: Peter Jackson, «O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»

Argumento: Sofia Coppola, «Lost in Translation»

Actor (Drama): Sean Penn, «Mystic River»

Actriz (Drama): Charlize Theron, «Monster»

Filme (Musical ou Comédia): «Lost in Translation»

Actriz (Musical ou Comédia): Diane Keaton, «Alguém Tem Que Ceder»

Actor (Musical ou Comédia): Bill Murray, «Lost in Translation»

Actor Secundário: Tim Robbins, «Mystic River»

Actriz Secundária: Renée Zellweger, «Cold Mountain»

Banda Sonora: Howard Shore, «O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»

Canção: «Into the West», de «O Senhor dos Anéis - O Regresso do Rei»

Filme Estrangeiro: «Osama» (Afeganistão)

Tiago Pimentel


«Lost In Translation»

Site Oficial

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«Virgens Suicidas» era um filme sobre a impossibilidade de compreendermos o feminino. Aliás, não tanto a impossibilidade, mas sobretudo o desejo masculino de recuperar as memórias de um amor que nunca existiu fora de uma penumbra mística e, no limite, se reconstrói nos impulsos amorosos mais laminares de quem sobreviveu para relatar a história das manas Lisbon. Era um documentário confessional filmado à distância, com a proximidade íntima de alguém que as amava, mas também com a incerteza admirável de quem as deificava. Eram deusas antes de serem mulheres, mortas antes mesmo de se suicidarem. Assim filmou Sofia Coppola o seu primeiro filme.

Sobre «Lost In Translation» paira essa mesma penumbra mística. Mas a mística desta vez não recai sobre ninguém em especial, mas sobretudo sobre a irredutibilidade da relação que se desenvolve entre Bob Harris (Bill Murray) e Charlotte (Scarlett Johansson). Existe, de facto, uma dimensão de errância associada não apenas à gravidade perdida de ambas as personagens (ambos pela alienação do seu casamento) mas, também, à cultura em que se encontram e que lhes é radicalmente alienígena, mas com a qual, no fim de contas, se acabam por identificar. Parecendo ser um filme sobre o fim do Ser (ou sobre as alturas em que nos confrontamos com o perturbante paradigma: afinal, qual o meu papel neste mundo?) é, na verdade, uma história sobre o recomeçar de algo. E nem tem que ser permanente, é apenas um despertar momentâneo, uma emoção efémera mas com o poder do eterno, uma vontade orgânica de mexer o corpo sem ser por obrigação ou reflexo, como se, pela primeira vez, se percebessem palavras sem necessidade de traduções.

E se Scarlett Johansson é um pequeno prodígio na ambiguidade dramática e mística dos seus movimentos errantes, Bill Murray é genial na reprodução contida de alguém que se encontra na insuficiência do seu próprio humor (ou amor). E se Scarlett consegue perturbar com apenas um pestanejar, Murray consegue arrancar uma gargalhada mexendo apenas um músculo facial. É um filme de actores com uma realização apaixonada, presente e, acima de tudo, com um respeito imenso pelos espaços das suas personagens. Não é um filme sobre o amor. Nem sequer é um filme sobre a amizade. É um filme sobre uma relação. É um filme sobre o momento. E é um dos filmes mais genuínos e honestos sobre o valor do banal, seja uma discoteca, um bar de karaoke ou um simples café.

Tiago Pimentel

domingo, janeiro 25, 2004

Há uma insólita perturbação e tristeza nas imagens que nos chegaram hoje do jogo Guimarães-Benfica. Foram imagens que nos recordaram a dimensão trágica que um directo televisivo pode alcançar. Fiquei particularmente sensibilizado pelas palavras de um jornalista da TSF (cujo nome não me recordo, confesso). Dizia ele que é complicadíssima a tarefa de um jornalista numa situação destas, uma vez que tem que relatar a situação com rigor mas, ao mesmo tempo, há um envolvimento emocional que afecta toda a imparcialidade cerebral do trabalho. E, de facto, à medida que viamos as imagens do jogador Fehér a rir-se e, segundos depois, a cair e dos seus colegas e amigos a lançarem as mãos à cabeça em desespero sem controlarem as lágrimas, sabíamos que seriam imagens que, seguramente, nos acompanhariam durante muito tempo. Duas horas e pouco depois recebeu-se a confirmação que o jovem jogador do Benfica, de 24 anos, faleceu depois de lutar contra várias paragens cardíacas. Pode parecer chocante dada a idade e condição física do jogador mas, na verdade, é mais trivial do que possa parecer. Aliás, ataques cardíacos são assustadoramente vulgares, como qualquer cardiologista vos dirá, em jovens até aos 25 anos. Lembro-me de um episódio de Frasier, a propósito deste trágico dia. Era um episódio onde tinha morrido um jovem, precisamente, de um ataque de coração. Frasier passeia-se pelo funeral e, preocupado pela sua própria saúde, tenta investigar as causas que podem ter originado a insuficiência cardíaca. Álcool? Bebida? Comida em excesso? Nada. Era um jovem saudável que até fazia exercício. E Frasier reconhece-se, assustado, na fragilidade da sua própria vida. No limite, toma consciência da sua mortalidade. Por paradoxal ironia, talvez seja essa a maior de todas as fontes de vida. Qual? Sabermos que a morte nos pode receber a qualquer momento e que nada podemos fazer para o evitar... a não ser viver.

Tiago Pimentel

sábado, janeiro 24, 2004



In The Cut

Site Oficial

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É importante entrar para o novo filme de Jane Campion com uma disponibilidade afectiva absoluta. «In The Cut» é um filme que perverte radicalmente o modelo romântico tradicional, como o conhecemos, e instaura uma sedutora sexualidade onde já não existe espaço para o amor nem para o erotismo. Aliás, não é bem verdade, existe espaço para tudo isso, apenas não como os conhecemos. E é importante pensar assim quando entramos em «In The Cut». É um filme decisivo para nos mostrar que conhecemos muito pouco das construções cerebrais e emocionais do amor. Mais do que isso, é um filme que nos desafia a acreditar que o amor pode existir na mais impura (de um ponto de vista social, hélas) e carnal das formas: o contrato sexual. Ou ainda: um filme sobre o medo de descobrirmos todas as formas de amar, sobretudo as que mais se distanciam dos modelos convencionais do romantismo.

Aliás, é um desafio também para os seguidores habituais de Meg Ryan que se habituaram a vê-la num registo mais leviano das comédias românticas e na menina bonita da América. Meg e Ruffalo formam um par romântico assombrados por uma interrogação absolutamente insólita. A saber: como combater os instintos mais carnais que sujam a pureza do amor? Mais ainda, como evitar que eles se sobreponham às suas vontades. Jane Campion é mesmo uma apaixonada pela sensualidade, aliás, por todas as formas de sensualidade. E se Ryan e Ruffalo se despem para relembrarem o corpo do que foi o amor, Jennifer Jason Leigh e Kevin Bacon são os fundamentos simbólicos do amor que cedeu à canibalização sexual dos corpos.

Tiago Pimentel

segunda-feira, janeiro 19, 2004

Falar dos filmes...

E se fosse possível perverter o modelo romântico, como o conhecemos, e instaurar uma sedutora sexualidade onde já não existe espaço para o amor ou para o erotismo? Aliás, não é bem verdade, existe espaço para tudo isso, apenas não como os conhecemos. E é importante pensar assim quando entramos em «In The Cut». É um filme decisivo para nos mostrar que conhecemos muito pouco das construções cerebrais e emocionais do amor. Mais do que isso, é um filme que nos desafia a acreditar que o amor pode existir na mais impura (de um ponto de vista social, hélas) e carnal das formas: o contrato sexual.

A semana passada vi também o furacão de Hong Kong que foi um verdadeiro fenómeno de bilheteiras do mercado interno. Falo de «Infernal Affairs», primeiro capítulo de uma trilogia que chega agora a Portugal. Vi o filme numa vergonhosa dobragem inglesa que desvaloriza muito um certo lado místico e, ao mesmo tempo, série-b que torna estes policiais tão sedutores (imaginem «Ghost in the Shell» dobrado). Tem coisas muito boas (Tony Leung, os ritmos serenos da montagem, o lirismo da realização, o moralismo desafiador da cultural oriental) e outras menos positivas (os ridículos «flashbacks», alguma incerteza e confusão no argumento, muito pouco interesse quando o filme se afasta de Tony Leung). Em todo o caso, parece-me importante descobrirmos os encantos deste início de uma trilogia que se glorifica já como um fenómeno de culto em Hong Kong.

As estrelinhas e textos mais alargados seguem depois.

Tiago Pimentel

sábado, janeiro 17, 2004

Sons

Já há alguns dias que não escrevia. Confesso que o tempo não tem sido muito, mas aqui estou de volta para assinalar a boa apresentação de Pacheco Pereira no seu espaço do telejornal da SIC. Falo concretamente do seu comentário à peça musical de John Cage e do valor que representa para a nossa relação com a musicalidade do silêncio. Para quem não viu hoje o espaço do comentador Pacheco Pereira, relembro que a peça musical em causa são cerca de 4 minutos e 10 segundos de absoluto silêncio. Ou seja, serve acima de tudo para perceber que a música nunca é uma concentração isolada de sons que nos chegam, mas antes um universo sonoro que se mistura com os nossos próprios sons (as buzinadelas dos carros lá fora, o irmão mais novo que não se cala, a casa dos vizinhos em obras, etc). Permitirmo-nos ouvir 4 minutos e 10 segundos de silêncio relança uma questão que tem menos de interesse musical em moldes tradicionais e mais de percepção humana. Que é como quem diz: sentirmos o peso do silêncio e a sua angustiante impossibilidade. Como rematou, e muito bem, Pacheco Pereira, mesmo no local mais insonorizado há sempre sons que se ouvem. Quanto mais não seja o do nosso próprio coração. É importante ouvir o silêncio de Cage e repensarmos a nossa relação com a música em geral como uma reestruturação dos nossos silêncios. Como se o silêncio fosse uma escolha nossa para, de facto, ouvirmos.

Tiago Pimentel

segunda-feira, janeiro 12, 2004

Night Blog

São 3 da manhã e o silêncio da noite já se abateu sobre a surdina dos meus pensamentos. Nestas alturas há que escrever, muitas vezes sem sentido nem nexo, todas as ideias, reflexões, pensamentos, palavras e sensações que conseguimos ouvir dentro de nós, já que durante o dia, os sons do mundo confundem-se com a nossa voz e a identidade da nossa verdade perde-se para a anonimidade global das incertezas da multidão. Geralmente é de noite que melhor organizo os pensamentos quando, por irónica curiosidade, é durante o dia que mais me faz falta essa capacidade de arrumação cerebral. Não deve ser apenas comigo, até porque o Sol é uma espécie de orientador máximo da rotina de cada um e, nesse sentido, torna-se difícil arranjarmos espaço para pensar quando nem sequer espaço para estacionar o carro conseguimos encontrar. Mas agora não. Agora posso ir até à rua, conduzir em oblíquas constantes na 2ª Circular de olhos fechados, sentar-me num banco e concentrar os meus pensamentos na musicalidade serena do mundo, ver um filme na televisão sem ser invadido por ruídos de fundo das furiosas buzinas de carros a apitarem contra a sua própria inquietude, ler um livro com a tranquilidade suficiente para ouvir as palavras, ou, se for dia para isso, expulsar todo o stress reprimido durante o dia numa discoteca onde a dança das luzes e a surdina da música escondem os problemas do dia que se perdem na imponderabilidade da memória. Eu podia fazer tudo isto mas, ironia das ironias, o corpo não me deixa. Amanhã o Sol acorda-me relativamente cedo e impede-me de viver os prazeres da noite por necessidade orgânica. Que necessidade? Dormir.

Boa noite,

Tiago Pimentel

domingo, janeiro 11, 2004

A Little Thing Called Oscar

É inevitável chegarmos a Janeiro sem pensarmos e repensarmos todas as obras do ano e os efeitos práticos que a cerimónia da Academia produzirá para a politização do cinema contemporâneo. E o passado tem-me ensinado que a relação das pessoas com os Oscars nem sempre é fácil porque, na maioria das vezes, é uma relação pensada num modelo exclusivamente clubista. Ou seja: ou ganha o filme que eu acho que deve ganhar ou então isto dos Oscars é tudo uma fantochada. Mantenho sempre uma relação de distância com este pensamento e gosto muito de ver os Oscars em três dimensões distintas: a do espectáculo puro como celebração encantatória da magia do cinema e de todo o seu passado; a sustentação da própria indústria, ou seja, acreditar que um Oscar é sempre um veículo para (re)lançar nomes ou títulos no mercado e assim renovar constantemente o tecido industrial; e, por último mas não menos importante, o condicionamento político que a mediatização megalómana desta cerimónia produz no pensamento sócio/cultural. Ou seja, é preciso percebermos que, provavelmente, «Chicago» nem era o filme de eleição dos membros da Academia, no ano passado. Mas o filme de Rob Marshall trazia consigo as acendalhas de «Moulin Rouge» que algumas mentes entusiastas elegeram como o regresso do musical. E num ano de luto para o mundo, «Chicago» parecia o filme ideal para arrumar com dois coelhos de uma só cajadada, isto é: consolidar o regresso do musical no cinema americano e repor alguma da alegria e «pure fun» das quais o cinema se serviu, ao longo dos anos, para enganar ou iludir a tristeza humana da infeliz realidade que ocupou o mundo (relembrar Capra, por exemplo).

Confesso que, no meu caso, não gosto de «Chicago» mas acabo por perceber a opção. Aliás, em boa verdade, o ano passado foi dos mais geniais e imprevisíveis em matéria de prémios e mensagens políticas. Foi o ano em que todos tinham uma incerteza quanto ao Oscar de melhor realizador, disputado na imprensa entre Scorsese e Marshall, e, no fim, a Academia decide atribuir o Oscar a um senhor que está proibido de entrar nos EUA sob pena de ser apreendido pelo FBI (Polanski, of course). Foi o ano em que «Chicago» ganhou o Oscar máximo por pressão intensa do big boss Weinstein, embora a mensagem tenha passado de forma invulgarmente cortante: «Chicago» ganha o Oscar máximo e alguns técnicos, mas os ditos artísticos ou importantes vão para «O Pianista» (actor, argumento e realização).

Este ano avizinham-se algumas alternativas. «O Regresso do Rei» começa a impor-se como o filme mais importante nestas primeiras entregas de prémios e o sucesso crítico é indesmentível. Por outro lado, «Cold Mountain» parecia ser a aposta mastodôntica (a la «Heaven's Gate») da Miramax para este ano, mas a ausência de Minghella dos nomeados para a DGA (Directors Guild of America) significa que dificilmente receberá sequer a nomeação para os Oscars. Ainda há «Mystic River», de Clint Eastwood que, a par do filme de Peter Jackson, parecem-me cada vez mais as apostas mais seguras para esta cerimónia. Mas conciliar estes dois filmes como potenciais vencedores implica algumas contradições importantes: primeiro, parece cada vez mais certo que Peter Jackson receberá o Oscar como compensação para a trilogia inteira. Mas, se tal vier a acontecer, não me parece também que depois «Mystic River» possa vir a ganhar sem o seu realizador ter sido premiado. Em segundo lugar, nunca na história da Academia um filme de aventuras ou fantasia foi premiado o que deixa «O Regresso do Rei» do lado negro das probabilidades estatísticas. Por outro lado, o negrume pessimista e intimista de «Mystic River» também não me parece coerente com a filosofia regular da Academia o que reabre novamente uma porta para «Cold Mountain». Aliás, duas se contarmos com o sucesso crítico avassalador de «Master and Commander». E «Monster»? Terá lugar de destaque ou será Charlize Theron a sua solitária representante?

E, com tudo isto, fica de fora o filme ideal (por todas as razões) para os americanos premiarem, por força da falta de promoção e da sua magra produção: «In America».

Tiago Pimentel

sábado, janeiro 10, 2004



«The Last Samurai», de Edward Zwick

Site Oficial

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Chega a Portugal um dos filmes mais falados a propósito dos Oscars. É um pouco desconcertante a sensação que tive durante o filme, até porque Edward Zwick é um cineasta de algum talento e com conceitos de produção apuradíssimos. Mas «The Last Samurai» parece-me mais um projecto de redenção pela forma como um certo cinema clássico ilustrou a complexa cultura índia e nipónica em modelos estereotipados e simplistas, do que propriamente um épico fulgorante e receptivo a todas as especificidades e diversidades culturais e humanas das suas personagens. Primeiro porque todas as personagens que tenham a ver com a ocidentalização estão, à partida, assombradas por uma estranha inércia existencial, reduzidas a uma presença escatológica sem estrutura ou densidade, apenas estereótipos simbólicos e maniqueístas daquilo que o filme quer promover como o lado mau (desde o maquiavélico Omura até ao tenente coronel americano que está no filme apenas para ser odiado).

Qualquer valor que o filme pudesse atingir, nomeadamente através da força épica das batalhas muito bem filmadas ou mesmo no intimismo dos choques culturais, é completamente alienado pela narrativa programática e forçada, pelas espessura anorética das suas personagens e por algum simplismo no tratamento da motivação dramática da personagem de Tom Cruise (a relação amorosa forçada e os «flashbacks» inseridos a martelo). Fica a respiração visual com dimensão da câmara de Zwick e os bons ritmos de montagem e um amargo sabor a desilusão.

Tiago Pimentel

quarta-feira, janeiro 07, 2004

«Bully», de Larry Clark

O Fim

Apesar de nos chegar depois de «Ken Park», «Bully» na verdade é anterior ao dito e só agora chega ao mercado português. E parece-me, venha o que vier, um dos filmes decisivos de 2004. Nos antípodas dos simplismos das telenovelas e das marionetas e fantoches adolescentes que nelas habitam, está o cinema de Larry Clark: sempre distante desses lugares comuns de que a adolescência vive nos fragmentos televisivos, mas intimamente próximo da sua mais genuína vertigem gravítica. Isto porque Clark filma os jovens directamente nas suas interrogações mais inconscientes. Ou seja, afasta-se do lado mais óbvio das telenovelas (os labirintos entediantes dos namoros e das traições) que acaba por ser a mais consciente e recitada problemática dos (e pelos) adolescentes.

Mas Clark não é um cineasta de citações; é, antes do mais, uma entidade paterna que filma a juventude como se de uma comunidade se tratasse, onde pode captar a gravidade perdida de uma certa realidade humana, observando os comportamentos, os movimentos, os sorrisos, as lágrimas e recusando, desde o ínicio, a rotina novelesca e de alguns péssimos filmes de adolescentes onde o jovem é uma espécie de andróide, clonado de filme para filme, reduzido ao sacana que só quer sexo ou ao eterno romântico cândido e imaculado. Longe destes estereótipos (infelizmente) tão recorrentes na cultura artística que retrata a realidade adolescente, «Bully» é um filme que vem de dentro; é uma espécie de documentário comportamental sobre as gravidades geracionais que se perderam.

O cinema de Clark não funciona numa lógica de denúncia. Apesar das figuras paternas permanecerem quase sempre exteriores aos circuitos primários da narrativa, são sempre fundações simbólicas da incompreensão linguística absoluta e do fosso ideológico/comportamental que os separa dos próprios filhos. E «Bully» nesse sentido é um dos argumentos mais apurados e subtis que Clark alguma vez filmou. Apoia-se numa simples ideia: o novo grupo de amigos de Marty quer ajudá-lo a matar o seu melhor amigo que o espanca desde miúdo. Filmar com esta crueldade e indiferença a morte tem dois efeitos distintos: um primeiro, a excitante aventura que este grupo de jovens despreocupado com tudo, pretende agora viver; e uma segunda, quando o filme nos mostra o lado mais inocente dos jovens, incapazes ainda de lidar com o peso humano, psicológico e dramático de algo como um homicídio (na verdade não haverá idade possível para lidar com algo tão insustentável).

Perdidos nesse efeito gravítico sem sentido, os jovens de «Bully» estão colocados num dos lugares mais ingratos do ser humano: a altura em que deixam a segurança de um lar para se prepararem para um novo mundo onde têm que se valer a si próprios. Estão no início de algo, mas «Bully» é um dos filmes mais trágicos sobre o fim da adolescência e, nesse sentido, sobre o fim de todo o romantismo do mundo.


Class.:


Tiago Pimentel

segunda-feira, janeiro 05, 2004

Momento de pausa

Confesso que o epíteto «momento de levitação» serviria melhor os propósitos indefinidos e puramente reflexivos deste post. Digo isto porque voltei a descobrir «Stateless», uma música que os U2 compuseram para o assombroso filme de Wim Wenders «The Million Dollar Hotel» (ainda serei um dos poucos que acha este filme um dos expoentes máximos de um desespero pós-moderno, cada vez mais nostálgico por um certo passado onde o mundo, como o conhecemos, ainda existia). E a música dos U2 é o recriar dessas sensações tão instintivas e, ao mesmo tempo, reflexivas pelos paradigmas que coloca nas suas frases (seja nas frases da própria letra da canção, como nas frases das cordas eléctricas ou nas firmes mas envergonhadas batucadas da bateria). Existe um efeito gravítico nesta música, de facto. Um efeito suspenso na imponderabilidade dos movimentos humanos no seu próprio espaço e tempo. Subitamente, deixou de existir. O quê? Tudo!... Tempo, espaço, sensações, pensamentos, relações humanas. Existe apenas um efeito de gravidade que percorre os corpos e os faz mover continuamente enquanto o tempo o permite. Assim mesmo... stateless.

I got no home in this world
Just gravity, luck, and time
I’ve got no home in this world
Just you, and you are not mine

Stateless
Fateless
Stateless
(shut you cold)

There are no colours in your eyes
There’s no sunshine in your sky
There’s no race, only the prize
There is no tomorrow, only tonight

Stateless
Oh... what’s the difference?
You can cover the world with your thumb
Still so big, so bright, so beautiful

Weightless
Stateless

Push down on me
Push, down on me
(Push)

Awake now
A weight, get down on me
Your weight... down...
Bring your weight on, down on me
Be the heavy hand, the mortal sand
Be the weight, heart, get down on me

Stateless
Weightless
Hey bliss...


Tiago Pimentel

domingo, janeiro 04, 2004

A crítica dos leitores

Olá Tiago Pimentel. Escrevo apenas para lhe dizer que concordo totalmente com a sua visão de Na América. Foi um dos filmes mais comoventes que vi estes últimos anos. Mas fiquei mesmo impressionada com o desempenho das pequenas (que ao que parece são irmãs?). Não é nada normal vermos miúdas tão pequenas a conseguirem desempenhos tão adultos. E o filme tem tudo no sítio, nunca chega a ser lamechas e é do mais comovente que tenho visto. Gosto muito de ler o seu blog e espero que continue a comentar filmes... e não só. Bom ano!

Joana Fernandes


Obrigado, em primeiro lugar, pelas suas palavras Joana. Tenho a certeza que o ano de 2004 também não nos deixará mal. Em relação ao «Na América», concordo com o que você disse. E deixe-me dizer-lhe que, a meu ver, o filme não chegará aos míticos sacerdotes do intelectualismo impenetrável, aqueles que gostam mesmo é de sentir a frieza cortante do cinema, enfim o anti-melodrama. Quero com isto dizer que quem não gostar de «Na América» é insensível? Claro que não, cada um terá a sua própria sensibilidade pessoal e intransmissível. Mas não duvide que, lá bem no fundo, todos temos algumas dificuldades em lidar com filmes que desafiam desta forma, emoções tão íntimas e utópicas. Das sessões a que tenho ido, grande parte do público está sempre à espera de um momento de humor para poder disfarçar o incómodo silêncio dos momentos dramáticos. Por vezes, essa ansiedade é tanta que soltam uma gargalhada num espaço e tempo despropositados. Porquê tanta vergonha em deixarmos que um filme nos conquiste? Será que o filme mexe com sentimentos tão íntimos e complexos que, de alguma forma, sentimos vergonha ao olharmos (como um espelho)? Não há que haver vergonhas nem que favorecer esta nauseabunda cultura hedonista que nos contamina o pensamento. Tentemos manter uma disponibilidade mental e afectiva máxima para todos os fenómenos que nos chegam. Afinal, no limite, é um dos ensinamentos mais fulgorantes deste «pequeno» filme.

Cumprimentos,

Tiago Pimentel
Podem continuar a enviar as vossas críticas e comentários para: tiago_pimentel@hotmail.com

quinta-feira, janeiro 01, 2004

Os Melhores de 2003


O «glamour» na recriação dos anos 60 que disfarça o negrume da assombração dolorosa que percorre o filme inteiro. Catch Me If You Can é a minha escolha do ano.


A serenidade hipnótica de Solaris é uma espécie de transe que se impõe ao olhar e ao pensamento. De repente, tudo parece possível e exterior a qualquer reconhecimento de espaço e tempo que a nossa Razão queira impor. A par do filme de Spielberg foram os dois acontecimentos decisivos do meu 2003.


Foi um ano de invulgar riqueza para o património cinematográfico. Sobretudo dos filmes de pequena produção como «Elephant», «Dogville» ou «Ken Park». E mais entusiasmante ainda é perceber que mesmo esses filmes começam a despertar o interesse do grande público. Talvez porque as pessoas cada vez lêem mais sobre os filmes que procuram. Por radical contraste, foi um ano de naufrágio para as grandes produções de Verão, desde «Exterminador Implacável 3» até «Tomb Raider 2: O Berço da Vida». Esperando retirar algum valor pedagógico destes dados, tentemos pensar que os estúdios finalmente aprenderam que não basta promover de forma selvagem um filme para que se encham os bolsos. Mais importante até que os artigos que possam ser escritos nos jornais, é o boca-a-boca, os amigos que dizem aos amigos que dizem aos amigos que filme X, Y ou Z é magnífico ou, por outro lado, intragável. E, claro, tanto funciona entre amigos, como na leitura de um destes inúmeros artigos jornalísticos que aparecem por estas alturas com os famosos «top10». Com a consciência de me enquadrar de alguma forma nessa máquina manipuladora de mentalidades e pensamentos, deixo-vos uma lista com os meus 10 filmes do ano e alguns que decidi destacar. Os dois filmes a negro foram os que mais me trocaram as coordenadas mentais e afectivas.

1. Apanha-me se Puderes
2. Solaris
3. Mystic River
4. Dogville
5. Elephant
6. Ken Park
7. A Última Hora
8. Herói
9. À Procura de Nemo
10. O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei

Menções honrosas:

11. Gangs Of New York
12. Far From Heaven
13. Full Frontal


Que 2004 seja um ano próximo da dimensão cinéfila que vivemos em 2003

Tiago Pimentel
2º revisionamento de «In America»

Continua tudo no lugar mas, talvez por sabermos o que vai acontecer, a vertigem emocional é cada vez maior. Como sabemos o que vai acontecer há mais tempo para atentarmos à tensão imprevisível dos diálogos, à métrica perfeita da montagem, aos castanhos tristes da fotografia, à existência física e espiritual das personagens não apenas como seres distintos mas também com a união intangível das suas fragilidades emocionais e desequilíbrios humanos para existirem também como família. O filme tem uma poderosa verdade: a de nos confrontar com o espelho da nossa intimidade emocional. Dentro dessa verdade, parecemos turistas das nossas próprias incertezas, a visitar os segredos do nosso espírito, a reconhecer pequenos fragmentos do nosso Ser mas incapazes de contemplar a totalidade do enigma humano. E no meio de tanto naturalismo e realismo, há uma respiração mágica que o filme destila. E os olhos das duas miúdas continuam tão genuínos e lancinantes, como pequenos focos de luz que nos iluminam os cantos mais dolorosos do coração. A ambiguidade dramática de «In America» define-se progressiva e gradualmente com o decorrer do filme: temos a sensação que estamos a ver um filme que nos fala sobre aprendermos a aceitar a morte, quando na verdade nos ensina a aceitar a vida.

Tiago Pimentel

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