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Um site para pensar sobre tudo e chegarmos sempre a um singular pensamento final: sabermos que nada sabemos.
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Tiago Pimentel
Críticas dos leitores para: tiago_pimentel@hotmail.com

segunda-feira, setembro 29, 2003

ELIA KAZAN (1909 - 2003)



E pronto! Morreu o último dos clássicos. Depois de Billy Wilder nos ter deixado, Kazan completa o infeliz ciclo do período clássico de Hollywood. É uma das notícias mais tristes dos últimos anos. Estranho sentirmos de forma tão íntima o desaparecimento de alguém que nem sequer conhecíamos. Ou talvez conhecêssemos; porque os filmes - a arte - é sempre a materialização do que de mais genuíno, sincero e humano existe dentro de nós. Então é legítimo dizer que também nós conhecíamos um bocadinho de Elia Kazan; e ele conhecia um bocadinho de nós - sabia como nos comover e emocionar. Foi o cineasta de filmes emblemáticos como «Há Lodo no Cais» e «Esplendor na Relva». Foi um dos responsáveis pela descoberta de novas formas de representar e de trabalhar actores, nomeadamente através da cofundação do Actors Studio, onde lançou nomes imortais como Marlon Brando. Foi também um homem envolvido em polémica com a materialização máxima disso a ocorrer durante a cerimónia dos Oscars em 1999, onde recebeu o seu Oscar honorário. Grande parte da sala não aplaudiu, manifestando a sua indignação e protesto através do silêncio. Quem estava ali no palco a receber o prémio era o homem que tinha dado do mundo «Há Lodo no Cais», «Viva Zapata!» e «Um Eléctrico Chamado Desejo» mas, ao mesmo tempo, era também o detractor de inúmeros colegas de trabalho durante a infame caça às bruxas. Como decidir? Enfim, para todos os efeitos, a Academia estava a premiar o cineasta e não as suas ideias políticas. O mundo do cinema ficou mais pobre. Com menos um cúmplice. Aguardemos para ver a reacção das pessoas à morte do cineasta que não aplaudiram enquanto estava vivo.



Tiago Pimentel

domingo, setembro 28, 2003

Razzle-Dazzle ou, como diriam os tradutores portugas, frases para confundir. Acima de tudo, frases onde apetece abandonar o sentido da (nossa) lógica e recebermos a dimensão poética e incompreensível da nossa existência. Enfim, o nosso humanismo passa sempre por compreendermos que nunca controlamos o conhecimento na sua totalidade. O dia começa e o Sol informa as nuvens que hoje está preguiçoso e não lhe apetece vestir-se. Irá permanecer nu o dia inteiro. Sem a protecção das nuvens, a sexualidade calorosa do Sol fica exposta às mentes conservadoras do mundo inteiro, recebendo o seu escaldante erotismo. É assim que, numa relação de profunda intimidade com a sensualidade perversa da Natureza (e sempre com a ideia presente de que um corpo tem sempre um lado sexual), as pessoas caminham pela rua com menos roupa, aceitando o atrevimento do Sol e a inquietação erótica dos corpos por si tocados. Contagiados pela sexualidade do calor, os corpos desnudam-se e procuram noutros corpos a sua própria alma. Procuram fora de si as respostas aos sinais dos seus próprios corpos.

Alimentados pela curiosidade implacável das suas condições humanas, esses impulsos levam-nos, por vezes, a procurarem corpos cujo brilho da pele é ainda demasiado inocente para que a sociedade lhe confira qualquer valor sexual ou erótico. Mesmo que o Sol os toque com reveladora impiedade, nada parece demover a sociedade do que parece evidente. Talvez porque muitas vezes se confunda sexualidade com uma atracção perversa e carnal no mais rudimentar e perverso sentido da palavra. E diga-se, em abono da verdade, que muitas vezes o corpo humano procura também esse sentido primário de sexualidade, esquecendo que a atracção entre dois corpos define-se pela distinção entre uma vontade e uma submissão. Mais ainda, entre a existência unilateral dessa dimensão erótica e a concessão mútua desse universo, baralhando a sociedade que favorece a perversidade humana e não acredita no amor. No «Corvo» alguém dizia a certa altura que a infância acaba quando a criança aprende o que é a morte. Talvez fosse mais adulto acreditarmos que a infância acaba quando a criança se apercebe que poderá estar nua (não estamos longe dos conceitos bíblicos, claro que não). Entretanto, a noite chega, os sobretudos vestem-se e os corpos escurecem. Muitos procuram na escuridão da noite uma forma de redescobrir o erotismo do Sol, escondendo a vergonha por baixo dos lençóis. Mas existe algo de erótico na forma como a noite nos esconde a saliva sexual da pele. Há algo de intenso nessa relação perversa com o escuro. Há e continuará a haver enquanto o ser humano acreditar que a sua sexualidade só existe quando está na cama a tocar outro corpo.

Chega de Razzle-Dazzle por hoje. Um dia destes instalo uma bolinha vermelha no canto superior direito desta página.

Tiago Pimentel

sábado, setembro 27, 2003

Seabiscuit e os melodramas

Existe, infeliz e incompreensivelmente, uma grande resistência sempre que surge um filme que recupera a tradição melodramática do cinema clássico norte-americano (Minnelli, Cukor, etc). Como se tivesse sido atribuído um local específico no tempo para o melodrama e fosse, assim, impossível sobreviver com as mentes contemporâneas, obcecadas com alguma estética pós-moderna (Fincher, Tarantino). Nada contra o imenso talento destes dois cineastas, mas não será possível o cinema e todas as suas correntes, coexistirem num mesmo espaço temporal? Enfim, «Seabiscuit» foi um filme que me ajudou a relembrar a beleza humana que contagia uma simples história; o gosto pelas personagens, de estar com elas, aprender as suas qualidades e fragilidades, enfim, deixar que sejam elas a contar a história e a desenvolver as suas próprias vulnerabilidades. Porque ser Humano passa também por aceitarmos as vulnerabilidades do próximo. E é natural que, quando aparece um filme capaz de expor de forma tão desarmante as suas personagens, se torne tão difícil de lidar com um objecto destes; porque nos fala de forma tão aberta e franca ao coração. É difícil voltar a acreditar na inocência dos anos 40, sobretudo o período pós-Guerra - altura em que tanto precisávamos de candura e fantasia. Será assim tão difícil ou ter-se-à o olho humano tornado tão cínico que seja impossível recuperar o olhar humilde e inocente que nos consome durante um Capra? Dir-me-ão que este filme não é um Capra. Provavelmente não. Mas está mais próximo de um Capra do que, por exemplo, de um Lasse Hallström.

«Seabiscuit» conta a história de um triângulo de vidas cruzadas pela necessidade de se transcenderem enquanto corpos narrativos e progredirem inexoravelmente para a aceitação do seu próprio destino - componente, aliás, fundamental no universo clássico do cinema. É, nesse sentido, um genuí­no filme de actores (destaque para o magnificamente discreto Chris Cooper). Vai sendo raro encontrar filmes que deixem as personagens falar e darem a conhecer-se de forma tão natural e comovente, como se fôssemos espectadores das suas vidas, mas num reality show que ainda acredita na honestidade expontânea dos seus corpos e recusa sempre a fotogenia reciclável das suas imagens e a superficialidade das relações humanas. Enfim, existe alguma ganga narrativa de vez em quando, sobretudo com alguns diálogos e enquadramentos históricos desnecessários à história mas que acabam por produzir, por vezes, um agradável efeito globalizante através daquelas personagens. Acima de tudo, este é um filme que relembra uma velha máxima transmitida pelas melhores gerações de cineastas: as situações não chegam para fazer funcionar o dispositivo melodramático; são, acima de tudo, as relações que construí­mos com aquelas pessoas durante aquele espaço de tempo que nos ficarão gravadas na memória.


Class.: ****

Tiago Pimentel

sexta-feira, setembro 26, 2003

O CONFESSIONÁRIO - You Must Be Kid(ding)man!



Será habitual na última sexta-feira de cada mês falar sobre algo que marcou a mediatização televisiva do respectivo mês. A rubrica chama-se Confessionário - quaisquer semelhanças com aquela divisão de uma certa casa onde o discurso oscila entre a má-língua e a obsessão casamenteira é pura e triste coincidência. Enfim, foi um mês marcado por pontualidades futebolísticas (o Porto-Benfica), pelas colocações universitárias e respectivas polémicas de papel higiénico na cidade que irá receber os veteranos Stones (ah, they can't get no satisfation). A propósito das colocações universitárias, o Instituto de Emprego e Formação Profissional revelou que o índice de desemprego, entre Julho e Agosto, subiu 0,4% (mais 26,% que o ano passado). Dos 420.891 indivíduos à procura de emprego, 15,5 por cento (65.164 pessoas) tinham menos de 25 anos (os futuros doutores e engenheiros que entram de brilho sibilante no olhar para as respectivas universidades). Enfim, num mês marcado também pelo lançamento do livro para crianças escrito pela verdadeira (ora pois!) rainha da música POP - Madonna - apetece-me, no entanto, que o tema do Confessionário deste mês seja algo de marginal e desafiante para a própria comunicação social mundial.

Falo, como devem ter visto pela fotografia e respectivo título, da forma como a actriz Nicole Kidman tem sido tratada no período pós-Óscares. Em primeiro lugar, há que relembrar os imensos projectos em que Kidman se meteu depois de ter ganho o Oscar pelo seu notável retrato de uma senhora chamada Virginia Wolf em «As Horas». Para além de «Dogville» (de Lars Von Trier), «Human Stain» (de Robert Benton) e «Cold Mountain» (de Anthony Minghella) - ambos de 2003 - a actriz tem ainda reservados «Birth», «The Stepford Wives» e «The Interpreter» para 2004 e «Emma's War» e um filme ainda sem nome sobre Alexandre, o Grande, ambos para 2005. A sobrecarga profissional a que Kidman se submeteu em conjunto com algumas dietas mais rigorosas forçaram a actriz a internar-se num hospital. Como se já não bastasse, parece que alguém anda mesmo a tentar sabotar a carreira desta actriz americana que cresceu na Austrália. Ainda há pouco tempo, no festival de Toronto, alguém veio divulgar, em nome da actriz, aquilo que ficou conhecido como uma extensa lista de "don'ts", ou seja, uma série de assuntos que a actriz se recusava a debater com a imprensa. Kidman desmentiu essa lista e disse que ninguém, com a sua autorização, iria dizer tal disparate. A Miramax chegou mesmo a exigir um pedido de desculpas pelo sucedido. É fácil de perceber que a imprensa tente descobrir algo de diferente em Kidman, sobretudo depois de ter ganho o Oscar (quase todas as actrizes se tornam insuportáveis uns tempos depois de ganharem a estatueta dourada - é necessário relembrar Julia Roberts?). Mas Kidman continua a mesma, a trabalhar em projectos formal e experimentalmente arrojados, sempre desafiando-se enquanto actriz e pessoa. É fácil de perceber que alguém esteja tão interessado em querer abalar a sua carreira. E parece que estão a conseguir. É mesmo caso para perguntar: Quem Tramou Nicole Kidman?

Fim de Confessionário



Tiago Pimentel

quarta-feira, setembro 24, 2003

«Hero», de Zhang Yimou

Sem quaisquer hesitações: um dos filmes máximos de 2003. Sobretudo, um filme que regressa à origem esquecida da imagem. A saber: nos primórdios de uma existência cinematográfica, TUDO pode existir enraizado nas suas próprias variações visuais. «Hero» é um desses filmes. Regressa ao diálogo mudo das imagens para melhor redescobrir os seus segredos e as cargas dramáticas que as variações pictóricas lhes possam impor. A partir dessa regressão, consegue respirar todo o fulgor interior de um universo que parece pedir uma relação muito íntima com cada movimento, com cada tonalidade, com cada textura e alterações de luz. Sem querer relembrar aquele lugar comum que diz que uma imagem vale mais que mil palavras, não é de todo descabido pensar no peso que a palavra imagem tem no universo cinematográfico -- sobretudo se olharmos para o cinema como a manipulação das imagens e, por consequência, do tempo.

Muitos pensarão nas semelhanças com «O Tigre e o Dragão», mas parece-me que, de facto, tais semelhanças, a existirem, começam e acabam nos voos sobrenaturais dos personagens. «Hero» bebe muito mais de Kurosawa («Rashomon» pois claro) e até mesmo de Bergman. É um filme visual, no mais puro sentido da palavra; e é um épico interior genuinamente humano, porque é da raíz das suas imagens que nascem as convulsões dramáticas e a própria fatalidade dos seus corpos. Não é um filme bonito no mais reciclável sentido da palavra. É um filme que, acima de tudo, devolve todo o valor humano e dramático ao conceito menosprezado da estética. É daí que tudo o resto nasce.

Classificação: *****


Tiago Pimentel

terça-feira, setembro 23, 2003



Lembrei-me de escrever uma notinha sobre um dos filmes máximos deste ano, ainda em exibição nas nossas salas: «Ken Park», de Larry Clark. Apetece-me falar e até ser ligeiramente provocador, até porque quando aparece um filme com sexo explícito e sem vergonha nenhuma das suas imagens, surgem logo as vozes dos missionários do voyeurismo. Mas será que já ninguém consegue ver a diferença entre um seio mostrado em «Ken Park» ou num daqueles thrillers pseudo-eróticos de encher a madrugada? Onde está a diferença? Não estará seguramente na dimensão imediata e mais ou menos reciclável dos membros desnudados que a câmara filma. Está, sim, na dimensão espiritual dos seus corpos; na sensualidade incontrolável dos seus desejos; na ternura imensa com que Clark abraça aquela pequena irmandade de jovens perdidos pelos ermos labirínticos da vida. Já não tinha memória de um filme tão paternal, mas nunca de forma moralista (enfim, no sentido mais maniqueísta que a palavra possa sugerir). Antes, é uma película filmada do lado paterno - não o dos pais, mas antes na ausência dessa dimensão. Como se Clark pudesse ser o pai omnisciente de uma geração inteira. Perdidos na sua própria orfandade, os corpos geracionais unem-se e reencontram-se constantemente nas suas próprias interrogações sexuais. O sexo, afinal, é mesmo a busca de uma identidade. De quem somos. Ou, como diz o título em português: Quem És Tu?

Tiago Pimentel

segunda-feira, setembro 22, 2003

FC Porto - S.L. Benfica

Provavelmente não se via um Porto - Benfica deste calibre há muitos anos. Em boa verdade, para generalizar sem medos, não se via um jogo no campeonato português com esta intensidade e qualidade há mesmo muito tempo. Primeiro porque o Benfica surpreendeu o Porto entrando no jogo como se jogasse em casa, levando a que a equipa treinada por José Mourinho tivesse que se adaptar ao jogo agressivo dos encarnados. Enfim, um erro invulgar de Miguel e uma cabeçada infeliz de Argel acabaram por matematicamente decidir o jogo a favor dos Dragões. Parecem-me bastante acertadas as palavras de José Mourinho quando afirma que foi o melhor Benfica dos últimos 10 anos a apresentar-se nas Antas.

Mas, como muitas vezes acontece, há uma figura que voltou a destacar-se (pela negativa...). Não, não foi o árbitro nem os seus auxiliares - embora tenham culpa indirecta. Nem foi o público que tantas vezes estraga os espectáculos com os assobios e os lenços brancos. Foram, sim, os comentários milimetricamente infelizes dos nossos comentadores de serviço, quer do jogo, quer dos resumos. Costinha faz uma entrada capaz de envergonhar qualquer especialista de artes marciais e os nossos técnicos comentadores concluem com absoluta sagacidade que "se a cor do cartão fosse outra não era de estranhar." Momentos depois, Deco faz um anúncio às piscinas do novo estádio e Ricardo Rocha leva um cartão vermelho por atirar com vigor a camisola ao relvado. Mais uma vez os nossos temerários comentadores mostraram a sua indignação. De facto, a questão tem que ser muito bem ponderada pelos quadros da Federação. Atitudes como a do Ricardo Rocha não podem passar impunes. É o futuro do futebol que está em jogo! Claro que a entrada assassina do Costinha é um esquálido cartão amarelo com alguma receptividade mental para outra cor mais fatal. Claro que pensar sobre o mergulho de Deco e a forma como matou um espectáculo memorável não é importante, nem sequer digno de referência - apenas para pontuar os comentários técnicos à suposta falta.

Que mensagem está a nossa televisão a enviar? Podem partir pernas com moderação, mas é imperdoável atirar camisolas ao chão? Não vá alguém tropeçar ou uma avó mais conservadora abrir um processo legal contra a Federação de Futebol por violação ética dos bons costumes. Num país evoluído, a bola dos comentários estaria do lado do mergulho de Deco e da forma como este alterou o jogo; ou, melhor ainda, suspendia-se Costinha por tentativa de homicídio (perdão... falta de fair play). Para não me entenderem mal, devo esclarecer que acho lamentável o acto de Ricardo Rocha. Mas, por favor, só quem nunca jogou futebol é que não consegue compreender que ser expulso por não fazer nada de errado é algo tão fervoroso que dá mesmo vontade de tirar a camisola. E, sinceramente, surpreende-me que tenha tido cabeça fria para nem insultar o árbitro. Nem sequer deu uma patada no Deco, daquelas para descarregar a fúria. Que demonstração de fair play... oops.

Tiago Pimentel

domingo, setembro 21, 2003

As novas tendências do cinema

Bem, o título deste segundo post poderia sugerir um texto sobre as novas tendências do cinema contemporâneo, nomeadamente as novas e inquietantes coordenadas que a despreocupação cinematográfica de Matrix Reloaded infligiu sobre o cinema clássico. Evitando então um texto facilmente catalogado de Velho do Restelo - mas com a promessa de regressar a este tema - prefiro recair sobre a dimensão simbólica, se quiserem, das novas tendências cinematográficas. A saber: as novas formas de ver cinema. Obviamente que o DVD é a alternativa mais justa para um filme que saiu das salas, mas há uma tecnologia que me parece importante referir para completar a experiência áudio-visual que um DVD permite e que um televisor acaba por condicionar. Falo-vos da tecnologia LCD dos projectores frontais. Tive um Epson Tw100 cá em casa a testar durante uma semana e fiquei francamente impressionado com as potencialidades do aparelho. Consegue reconstruir, na medida do possível, a experiência de regressar às salas. Enfim, ainda é uma tecnologia cara com tendência cada vez maior para descer os preços. Este Tw100 foi o aparelho que ganhou o prémio EISA o ano passado e é coisa para custar a modesta quantia de 6000 euros, mais coisa menos coisa. Boas notícias: a Epson vai lançar no princípio de Outubro o novo modelo TW-10 que está a ser aclamado pela crítica como o melhor projector na relação preço-qualidade. Estamos a falar de um aparelho para 1000 e poucos euros. Também a Sony se prepara para lançar os seus novos Hs-3 e Hs-20. O mercado está a evoluir vertiginosamente e quem ganha é o consumidor. Ainda assim, os projectores parecem-me uma tecnologia ainda dirigida apenas para o público cinéfilo. No fundo, o desejo do consumidor é reconstruir a sala de cinema em sua casa. Mas há algo que se perde e nunca se recupera. É impossível reconstruir o ritual que uma ida ao cinema simboliza. Seja como for, esse mesmo ritual tem sido desconstruído e até menorizado ao longo dos tempos. A evolução tende para uma desmistificação de tudo isso, de tal forma que o cinema do futuro poderá mesmo ser projectado num lugar que não tem que ser necessariamente uma sala de cinema. Isto será bom ou mau? É normal termos medo da mudança mas é um erro infantil pensarmos que o cinema morrerá com isso. Ele continuará a existir, mesmo que com outro nome. E nós cá estamos para pensar a evolução.

Tiago Pimentel

sábado, setembro 20, 2003

Os Primeiros Pensamentos

Está na moda ter um blog. Se calhar porque é uma maneira de termos um espaço destinado apenas para dizermos tudo o que pensamos. E não é fácil pensar hoje em dia, sobretudo numa cultura favorecida pelos simplismos televisivos dos BigBrother e das telenovelas que colocam a complexidade imensa do Ser Humano numa lógica bipolar de bom e mau, bonito e feio ou simpático e antipático. Como se fosse possível decidir tudo nestes limites. Como se as pessoas fossem pequenas marionetas condicionadas apenas por um ou dois adjectivos mais ou menos genéricos.

E esta incapacidade de lidarmos com todas as dimensões do Humano, cria um outro problema (mais grave): os silogismos. Pensarmos, por exemplo, que as pessoas mais importantes da nossa vida, sobretudo os amigos, nos vêm como pequenas personagens de uma telenovela é no mínimo preocupante. Como se todas as nossas atitudes pudessem ser explicadas ligando várias acções diferentes, sobretudo se isso evitar uma reflexão mais intensa. Numa novela é fácil pensarmos sobre os seus "dilemas": o Alberto não deve ficar com a Maria porque o Carlos é mais simpático e bonito. Enfim, aplicar estes raciocínios numa novela não é grave, até porque o seu formato está limitado à partida. Mas usarmos essa preguiça mental para pensarmos (ou evitarmos pensar) sobre a nossa realidade é, de facto, grave.

Partirmos do princípio que sabemos sempre o que estimulou um certo comportamento numa certa pessoa é, à partida, um erro. E o erro só piora se decidirmos não procurar as razões desse comportamento e nos acomodarmos à nossa preguiça de pensamento. Já vi muitas amizades acabadas ou suspensas por esta razão. Tudo porque decidimos olhar para a alma das pessoas com uma bússola de coordenadas simples, escolhendo ignorar todas as subdimensões que existem entre essas coordenadas e que, no limite, acabam por nos definir enquanto Seres Humanos. A memória das pessoas é cada vez mais construída à imagem da que o futebol promove: somos os melhores amigos numa altura, e noutras, porque decidimos não compreender os comportamentos aparentemente incompreensíveis, voltamos à estaca zero e tudo é esquecido... tal como uma telenovela. É uma pena que a televisão promova os pensamentos uniformes. É uma pena que as novas gerações tenham que nascer nesta nova cultura sonolenta e hedonista esquecendo o verdadeiro valor das relações humanas. Bem-vindos ao meu blog.

Tiago Pimentel

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